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Do amor - Vida e Morte

Niterói, 26 de janeiro de 2012

Se existe algo que pode fazer com que um indivíduo transite entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos, sem que tenha terminado de fato os seus dias, não poderia ser outra coisa se não o Amor.

Irmão gêmeo da Vida, irmão gêmeo da Morte, o Amor não é nada além dos dois. Ambos. Ao mesmo tempo. Se pode o Amor dar vida ao mais desbotado dos seres, é também ele quem rouba todas as cores; ele, quem cria zumbis. Pessoas que estão vivas somente pela grande força que é o organismo, mas que em seus corações e em suas mentes nada mais há que torpor. Indiferença. Ausência até da própria dor.

Se o Amor é libertário, a carta de alforria, ele também sabe ser o carrasco mais cruel, o cadafalso onde morrem todas as esperanças, as alegrias passadas, as incertezas futuras.

Se o Amor é o sumo bem, é também seu irmão gêmeo: o sumo mal. Um mesmo ser: duas naturezas, opostas e necessárias uma a outra. Se Amor é Deus, é igualmente o Diabo.

Se enganam os que pensam que foram as guerras, as doenças, os verdadeiros responsáveis por todas as mortes do passado e do presente. Se enganam, pois a nenhum outro ser, sentimento, ou sei lá isso que é o Amor, foi reservado o trabalho de retirar os homens da terra... Quando não fisicamente, pelos menos existencialmente. Se as pessoas não matam ou se matam pelo Amor – por covardia ou falta de convicção –, elas ainda assim deixam de existir; deixam de sentir.

É o Amor o bem mais precioso que o homem foi capaz de encontrar. É ele, essa gema preciosa, a sua perdição. Ao alcançar o céu, o homem encontrou o Inferno.
Do Amor nascem todas as coisas, e, nele, todas as coisas murcham, se apagam, desbotam, definham, desaparecem.

Quisera que o Homem nunca tivesse encontrado-o. Que toda sua existência se desse na ciência e na razão. Mas, por um dia ter mordido o fruto do conhecimento, toda sua mediocridade foi-lhe roubada. Em Queda, o Homem tornou-se naquilo que há de mais belo e sombrio na Natureza: ele tornou-se nele mesmo. Esse símbolo, esse fruto do conhecimento que é o Amor aprisionou o homem naquilo que chamamos de “vida mortal”. O Amor trouxe-o à Vida, e, junto com ela, à Morte. Os dois seres indissociáveis. O fruto do conhecimento expulsou o homem do paraíso, da filosofia, restando-lhe, agora, apenas o flerte interminável com o mundo perfeito. Em versos e em prose tenta ele recuperar o paraíso que perdeu.

É, pois, o Amor tudo o que o homem um dia almejou, mas que ao encontrá-lo, amaldiçoou-se.

9 Comments:

  1. Anônimo said...
    Caro Alan,

    A vida é uma pedra de amolar, desgasta-nos ou afia-nos, conforme o material de que somos feitos. (George B. Shaw)
    A experiência lança nova luz sobre fatos e pessoas. Pena que é uma luz de ré...
    Espero que você saia afiado.
    Atenciosamente
    Senhorinha
    Alan B. Buchard said...
    Pena que é um luz de ré...
    Anônimo said...
    Caro Alan,

    A morte é um tema recorrente em seus escritos, mas o que parece um caminho de saída pode guardar surpresas (de "outros não sabidos", como temia Hamlet:

    Morrer... dormir...
    dormir... Talvez sonhar... … Eis o dilema:
    O não sabermos que sonhos poder trazer o sono da
    morte, quando ao fim desenrolarmos toda a meada
    mortal, nos põe suspensos …
    Quem levaria fardos, gemendo e suando sob a vida fatigante,
    Se o receio de alguma coisa após a morte,
    - Essa região desconhecida cujas raias
    Jamais viajante algum atravessou de volta –
    Não nos pusesse atônita a resolução, nem nos fizesse tolerar os nossos males
    De preferência a voar para outros, não sabidos?
    ( SHAKESPEARE, Hamlet, ato lll, cena 1)

    Atenciosamente
    Senhorinha
    Alan B. Buchard said...
    A morte foi, desde sempre, um dos principais temas da filosofia, a partir da constatação de ser a única certeza da vida. Logo, um objeto irresistível para homens de pensamento ? considerando que, então, todo resto é dúvida. Porém a morte é uma certeza paradoxal, pois uma certeza opaca: sabe-se que ela é certa, mas dela não se sabe nada ao certo. Ou talvez se saiba tudo, que é ser o fim da vida. O que se sabe, enfim, com certeza, é não o que seja a morte, mas o que não seja: isto é, a não-vida. Não-vida que se revela, assim, parte certa, incontornável, da vida. Pensar sobre a morte revelou-se, afinal, pensar sobre a vida. Foi por esse caminho que trilharam os primeiros filósofos gregos, concluindo, de um lado, que a vida é uma longa preparação para a morte, e de outro, que a morte não existe, porque, ao morrer, um homem deixa de existir, logo, não pode viver a própria morte. E se ela não será jamais vivida, por mais certa que seja, não faz afinal parte de vida, não fazendo, então, nenhum sentido se ocupar dela ou se preocupar com ela. Uma certeza clara que resta dessa certeza complexa é, enfim, ser ela um dos temas mais naturais (em mais de um sentido) da filosofia.
    Anônimo said...
    Caro Alan,

    Sócrates (470-399 a.C.) explicava a seus discípulos que morrer deveria ser uma
    das duas coisas: ou o morto é igual a nada (estado de não-existência) ou trata-se de
    uma mudança da alma, deste para outro lugar e que, segundo ele, seria resultado
    da lógica racional supor que a vida continua após a morte (PLATÃO, 1999). Quando
    questionado por Críton sobre como deveriam enterrá-lo, respondeu:
    (...) se meus amigos virem cremar ou enterrar meu corpo, não devem afligir-se como se alguma
    coisa horrível estivesse acontecendo a Sócrates, e nem devem dizer que é Sócrates que se
    incinera ou que se conduz ao túmulo. Tão-somente seu corpo será sepultado, da maneira que
    os amigos consideram melhor e que pareça melhor corresponder aos costumes: Sócrates
    mesmo terá partido há muito. (JASPERS, 1965, p.137).
    Apesar de haver um número considerável de pessoas que advogam a tese de
    que tudo se finda com a morte, isso não é o reflexo da opinião pública. Não
    importam os cientistas e suas certezas, seus experimentos científicos, suas
    verdades lógicas comprovadas em tubos de ensaios. Embora um sistema intelectual
    necessite de alguns princípios de verificação e insistir em provas concretas
    favoreçam a clareza, a precisão e possam dar alguma garantia de verdade, um
    método assim impõe muitas limitações. Se a prova da verdade for unicamente a
    evidência observável, isso nos levaria a excluir algumas das áreas mais relevantes
    da vida, como a morte e todos os anseios legítimos que a cercam, e a forma como
    as distintas culturas lidam com ela. É difícil discutir a morte de maneira racional, a
    não ser quando ela está, supostamente, bem longe. Uma vez que se acerca, se
    aproxima, na história de um amigo jovem que adoece e morre em poucas semanas,
    no acidente do primo que, de uma hora para outra, já não está, ao saber do colega
    de trabalho que saiu ontem e que nunca mais voltará para lugar algum, então as
    reflexões transcendentes ganham força e tornam-se mais constantes.
    ...apesar disso, há quem negue toda e qualquer autenticidade não só à admirada frase, mas a
    todos os acontecimentos daquela noite memorável, quando, em hora duvidosa e em condições
    discutíveis, Quincas Berro Dágua mergulhou no mar da Bahia e viajou para sempre, para nunca
    mais voltar. Assim é o mundo, povoado de céticos e negativistas, amarrados, como bois na
    canga, à ordem e à lei, aos procedimentos habituais, ao papel selado. Exibem eles,
    vitoriosamente, o atestado de óbito assinado pelo médico quase ao meio-dia e com esse
    simples papel – só porque contém letras impressas e estampilhas – tentam apagar as horas
    intensamente vividas por Quincas Berro Dágua até sua partida, por livre e espontânea vontade,
    como declarou, em alto e bom som, aos amigos e outras pessoas presentes. (AMADO, 1997,
    p.2).

    Atenciosamente
    Senhorinha
    Anônimo said...
    Caro Alan,
    Sobre a morte e a aposta de Pascal:

    Prefiro equivocar-me crendo em um Deus que não existe a enganar-me não crendo em um Deus que existe. Porque se depois não há nada, evidentemente nunca o saberei, quando mergulhar no eterno vazio; mas se algo e se há alguém, terei de dar contas de minha atitude de desprezo. (A aposta - Blaise Pascal, matemático e escritor francês, 1623-1662)

    Atenciosamente
    Senhorinha
    Alan B. Buchard said...
    Senhorinha,

    A aposta de Pascal é super válida. O único problema é que ela é cristocêntrica.

    Pense: se realmente existir Deus, pagarei pelo meu desprezo. Mas se for um Deus não cristão? Eu, sendo cristão vou pagar por esse sacrilégio. Então, de todas as formas, existindo Deus, temos problemas. E, limitado que somos, como saberemos qual Deus é aquele que realmente existe? Responder essa pergunta é se suma importância, já que nossa aposta está comprometida antes mesmo de começar...

    Se quiser debater mais comigo, mande seus comentários pro meu email. Dá trabalho ter que ficar publicando comentários, para depois comentá-los...
    rsrs
    Anônimo said...
    Caro Alan,
    E o "lastro de sua vida", como vai?
    Pela falta de notícias aqui, sei não, penso que naufragou, estou certa? Não estou "agourando". Se você for feliz, o mundo será mais bonito e eu ficarei contente, mas como eu disse antes, uma pessoa é um porto bem frágil para ancorar, seja ela quem for. Perdão, mas você nunca será feliz ao lado de alguém enquanto não o for, sozinho.
    Não se esqueça dessa busca (por seu lastro), ela é muito importante. Não a encubra ocupando seu tempo com futilidades para não pensar nisso.

    Carinhosa e atenciosamente

    Senhorinha
    Alan B. Buchard said...
    Senhorinha,

    O lastro foi reparado. Até um outro lastro ser feito...

    A falta de notícias deve-se a mínima vontade de escrever algo nesse blog. Tenho escrito muito, mas registro tudo no meu caderno pessoal. Não estou muito a fim de deixar terceiros participar de minha vida nesse momento. Tenho muitas idéias para escrever no blog, porém, espero a vontade chegar...

    Não há que se perdoar a dor que uma verdade causa. Por isso, não precisa pedir desculpas por me dizer algo tão verdadeiro quanto: "você nunca será feliz ao lado de alguém enquanto não o for, sozinho."

    Bingo... Eu sei disso tal como o é dia. Na verdade, eu sou um daqueles que diz isso para as pessoas. Depois de ler H. Hesse não há nada que eu possa levantar como objeção à sua frase. O caminho da existência é um caminho solitário...

    Acontece que nesse nosso caminho algumas pessoas conseguem amenizar nossa dor, nossa solidão. A minha foi - e ainda é - amenizada por um único individuozinho e, se o perco, ela só aumenta. A dor. A solidão. Estando com ele essas duas continuam, mas não são tão latentes...

    Por fim... Antes mesmo de aconselhar-me a não ocupar o meu tempo com futilidades, eu já vinha fazendo isso. Não sei por quê, mas não sou daqueles dados a correr do confronto...

    Meu email: alanbuchard@hotmail.com

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