Niteroi, 28 de fevereiro de 2012
Surgiu quando menos esperávamos...
Pode parecer clichê, mas penso que foi amor à primeira vista. Se não, amor à primeira conversa. O local também não poderia ser mais clichê: retiro espiritual de igreja. Digo clichê, pois, onde um filho de pastor haveria de se apaixonar por um filho de diácono? Enganam-se os que pensam que retiro serve para “retirar-se do carnaval”: retiro religioso é retirar-se para um carnaval privado. E, nesse carnaval particular, imerso numa áurea de santidade, surgiu um dos amores mais profanos, execrados, aplaudidos, idealizados, desiludidos, e renascido Amor.
Acontece que esse Amor, que até então não sabíamos que era Amor, só pode florescer em 2009. Tal como as frágeis flores que crescem entre as rochas, entre muros, nosso Amor cresceu entre as rochas da família, da sociedade, de nós mesmos. Como somos um casal gay quase clichê, não havia outra saída para essa flor que crescia tão sufocada no solo do Espirito Santo se não plantá-la em outros solos. Decidimos plantá-la no Rio de Janeiro. O sol da tolerância, o adubo de amizades despreocupadas com a orientação sexual e a água descontaminada da religião e do sexismo fizeram com que a planta crescesse e desabrochasse. A cada dia tornava-se mais bela.
Assim chegamos a 2010. Ano do aprofundamento das raízes. O Amor crescia a cada nova estação. No Verão o calor nos consumia, mas sempre arranjávamos algum lago de águas frias para nos banharmos. No Outono nossas folhas caíram. “O inverno está chegando” e era preciso que nossas forças fossem concentradas naquilo que havia de mais essencial. O Inverno chegou, e com ele todo mal tempo. Não havia mais nenhuma folha em nossos galhos. Porém, não julgue estar morta uma árvore só porque lhe faltam as folhas. Dias passaram. Por fim, chegou a Primavera. Com ela veio as cores, o canto dos pássaros, o aroma das flores e a alegria. Quando a primavera chega, quem se lembra do Inverno? Assim foi 2010.
Até que... chegou 2011! Como haveríamos de saber que nesse ano nosso Amor seria sacudido por tantos ventos? Que folhas, caule e raízes seriam abalados? Como filho da Tormenta nosso Amor só trovejou, soprou, inundou, destruiu, aniquilou. Fomos consumidos por nós mesmos. O Amor tornou-se seu próprio inimigo. Antes, que não houvéssemos nos amado! Maldito seja o dia que nos vimos pela primeira vez. Amar? Sofriemento. Amor? Ilusão! O Amor pôs-se em xeque. Quem é você? Por que veio até nós? Por quem nos apaixonamos? Melhor fosse que naquele 28 de fevereiro de 2009 nós tivéssemos nos desencontrado. Dois monstros igualmente insuportáveis. Leão e Escorpião. Não fomos avisados pelos astros que não é possível a harmonia entre signos totalmente opostos? Um, pai do egoísmo; outro, pai da vingança. Quebramos os espelhos, restou-nos a desilusão. Tiramos as máscaras, nos traímos. Um ano onde o anjo foi amordaçado e espancado pelo demônio. Decretaram para nós o término do conto de fadas e nos arremessaram no caótico mundo real. Como haveríamos de suportar? Não suportamos. Primeiro término: Eu. Segundo término: Ele. Neste mundo há lugar para o mocinho e para o bandido: ora eu, ora ele, ora ambos. Vencemos a todos. Na guerra contra milhares fomos vencedores. Na guerra de apenas dois, perdemos. Nadamos, nadamos, nadamos e morremos em nós mesmos. Abrimos feridas em nossos corações. Tentamos cicatrizar, mas por vezes a putrefação já estava avançada. Jorrava sangue e pus. Jorrava nós mesmos.
Que eu não seja ingrato. Durante 2011 não estivemos exclusivamente no Coliseu, nos degladiando. Houveram reconciliações, choro sincero, beijos apaixonados, sexo quente. Como todo coisa é seu oposto em si mesmo, o Amor também venceu. Perdões foram concedidos. O sorriso voltou para o rosto. As alianças foram polidas e voltaram para suas casas. Amor: filho da Tormenta e da Calmaria. Amor... todas as coisas, todos os momentos.
Finalmente, 2012. O último ano de uma Era, assim nos diz o calendário Maia – ou assim dizem que ele diz. A mistura de Copacabana e Reveillon só podia resultar em juras de amor eterno. Pena que não durou muito. Quinze dias e um término com proporções semelhantes à 2011. Sem chance de volta. O fruto apodreceu e caiu da árvore. Caído ao chão, dado às larvas. Porém, nas histórias extraordinárias algo sempre nos escapa. Dessa vez, uma semente. Assim como é do Amor não ser compreendido, é do Amor as surpresas. Bastou um grão, num solo castigado. Pode ter sido um pássaro, ou uma chuva a espalhar as sementes, como saberei? Mas já bastou. Uma semente: uma conversa. Uma gota de chuva: uma lágrima. Ela brotou nos olhos, rolou pelo nariz e rosto, tentou se agarrar ao queixo, driblou a mão no ar e caiu no solo. Bem no coração, em cima da semente. Como no conto “João e o pé de feijão”, não foi necessário muito tempo até que a árvore crescesse, crescesse e crescesse. Cresceu rápido porque nunca havia deixado de existir.
E cá estamos. Algum tipo de loucura ou obsessão nos une. Um pouco de cada, ou ambos ao mesmo tempo. Quem sabe esses não sejam os verdadeiros nomes do amor? Quem pode dizer? Não eu! Na verdade, quem pode dizer algo do Amor sem antes começar a frase com o “para mim”?! Quem conseguiu separar o Amor da paixão, se é que são coisas diferentes? Quem é capaz de dizer que há Amor e/ou não há Amor?
Até quando dessa vez? Os otimistas dizem: para o resto da vida. Os pessimistas: alguns poucos meses. Como ambos habitam a mesma mente, não há como decidir. Ora somos um, ora somos outro, ora os dois ao mesmo tempo. Não importam as previsões, elas estão além de qualquer observação. Talvez diga-nos algo o único Deus que existe: dizem que ele passa para a gente, mas, penso como Boaz Sommo (Guideon): “Talvez seja o contrário: nós passamos dentro do tempo. Por acaso eu sei? Ou o tempo é que passa as pessoas.”
Passaremos todos por ele. Esse Amor um dia passará. Todas as coisas um dia morrerão, tal são os desígnios desse Deus. No final, ficará apenas Ele, e sua implacável ira. Mas, diante dele estamos tranquilos. Não pecamos por não tentar. O orgulho não nos seduziu. A distância tampouco aplacou o sentimento. O conhecimento de outros mundos não foi capaz de pôr em esquecimento o mundo que surgiu naquele 28/02/2009. Do mal da resignação não morreremos. Fizemos e continuamos a fazer tudo que esse Deus põe em nossas mãos.
Dois filhos da Tormenta. Dois filhos do Amor. Dois universos que ao se encontrarem produzem buracos negros e supernovas. Se há algo que aprendi nesses 3 anos foi que eternamente seremos esses dois seres estranhos um ao outro. Essas duas vidas completamente opostas. Dois rapazes infinitamente complexos. Mas ainda assim desejosos pelos mistérios um do outro. Por esse tesouro escondido que talvez nunca achemos. Não há racionalidade nesse relacionamento. Não estamos juntos por uma questão de mérito. É puramente sentir.
Seguimos sendo eternamente a fusão de fogo e gelo. E, se o gelo pode queimar, somos tudo ao mesmo tempo. Somos um só!
Feliz 3 anos, meu amor...