Jaques-Louis David (A morte de Sócrates - 1787)
“
Não sei atenienses, que influência exerceram meus acusadores em vosso espírito; a mim próprio, quase me fizeram esquecer quem eu sou, tal a força de persuasão de sua eloqüência. Verdade, porém a bem dizer, não proferiram nenhuma. Uma, sobretudo, me assombrou das muitas ‘acusações falsas’ que disseram sem fundamento: a recomendação de cautela para não vos deixardes ‘iludir’ pelo orador formidável que sou. Com efeito, não se envergonharem de me haver eu de desmentir prontamente com os fatos, aos mostrar-me um orador nada formidável, eis o que me pareceu o maior de seus descaramentos, salvo se essa gente chama formidável a quem diz a verdade; se é o que entendem, eu cá admitiria que, em contraste com eles, sou um orador.” (
Apologia à Sócrates, Platão)
Como continuação, em assunto, do texto anterior, veio a bem calhar esse trecho da obra de Platão que mostra Sócrates diante de um tribunal, sendo acusado de perverter a juventude ateniense e de cultuar deuses estranhos, contrários aos adorados em Atenas. O trecho que transcrevi é o início daquilo que seria a defesa do filósofo, que apesar de tão profunda e sincera, não conseguiu evitar sua condenação: morte pelo veneno cicuta.
O que na verdade quero retratar com este novo texto é exatamente esta habilidade que alguns possuem de persuasão, que da forma como utilizam é indecente e muito pouco moral.
Recordo-me, para tanto, de algo que me ocorreu em maio passado, ocasião onde fui convocado a prestar contas de minha sexualidade diante dos ministros de minha ex-igreja: o ministro titular e o de jovens. Muitos que não passaram por essa inquisição talvez não saibam a dimensão desconcertante dessa situação, mas alguns bruxos e bruxinhas saberão do que se trata o que digo.
O que ocorreu naquele gabinete foi algo semelhante ao ocorrido a Sócrates: um réu acusado, dois inquisidores, e uma lista de pecados cometidos contra o vigente governo. Acusado de destruir famílias e de causar extremo sofrimento a uma igreja em seu centenário, este foi o cerne de seus jogos persuasivos. Durante algum tempo os inquisidores pintaram um quadro escatológico, culpando-me a ruína da PIBCI. E usando de sua eloqüência conseguiram me abalar, e fazer com que eu chorasse, o que os ingênuos pensaram ser minha consciência pensando.
Como afirmou Sócrates “a mim próprio, quase me fizeram esquecer quem sou tal força de persuasão de sua eloqüência”, eu também quase me esqueci da realidade ao imaginar um quadro ilusório que os sacerdotes criaram. Abro uma observação: se querem se sentir extremamente inferiores e o último dos hereges visitem esses gabinetes! Contudo, o que me manteve a sanidade foi a verdade. A verdade que o que ocorria não significava nada a não ser chantagem emocional e dogmática, além dos fatos serem em sua maioria, senão todos, exagerados.
Como se essas acusações não fossem o suficiente, passaram a acusar-me de persuadir outros, usando de argumentos filosóficos e teológicos, trazendo-os para minha visão. Ora, tal fato eu hei de desmentir, já que não se tratava de discursos eloqüentes para convencer leigos, mas de expor minha experiência, contudo, se mostrar uma verdade a todos é fazer uso da filosofia, sim, dela eu fiz uso!
Mesmo da forma como eu aqui resumi, esta história não poderia ser diferente da de Sócrates: fui convidado forçosamente a me desligar da comunidade religiosa, assim como Sócrates foi forçado a se matar. E por fim, nessa hora afirmava como o filósofo: “
Bem, é chegada a hora de partirmos, eu para a morte, vós para vida. Quem segue melhor rumo, se eu, se vós, é segredo para todos, menos para a divindade”. Cada um faça sua interpretação.
"Cada um faça sua interpretação." Sócrates
Sua frase carece de fontes. Até que prove o contrário, nenhum peso possui em si!