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Da guerra à filosofia

UFF, 27 de maio de 2010


É impressionante perceber que na guerra, no conflito, na tragédia reside o embrião da liberdade. Como diria Heráclito – filósofo pré-socrático: “De todas as coisas a guerra é pai, de todas as coisas é senhor”. Tudo é criado na guerra, em guerra; do tudo ela é senhor.

A Grécia, antes de ser essa estupenda Grécia que comumente se conhece – com belos templos, magníficos deuses olímpicos, com filosofia sublime, com a democracia na ágora –, ela era parte do reino micênico. O grandioso império micênico se concentrava nas mãos do ánax, título hoje que daríamos a um rei. O ánax era chefe de todas as coisas: casas, riquezas, objetos, lugares, além de ser chefe de tudo: da sociedade, da religião, da economia. Um soberano Absoluto! Possuía contigo um grupo elitizado, chamado escribas; estes redigiam todas as leis, todos os ritos, todos os sacrifícios, toda produção. Todo saber, consequentemente, todo poder, se encontrava nas mãos desses personagens. Em detrimento destes, era o povo: inculto, analfabeto, manipulado.

Este foi durante muitos séculos, o quadro histórico da Grécia. Bastou que chegasse o pai de todas as coisas: a Guerra! O império micênico foi invadido pelos Dórios, no século XII a.C, um povo “bárbaro”, “bruto”, “incivilizado”. Ao que se esperava, toda essa organização micênica desapareceu! Nada sobrou, a não serem alguns poucos objetos que se tornariam achados arquelógicos para nós. Pode parecer trágico, mas foi exatamente o que surgiu durante esses séculos de dominação dórica que moldaria mais tarde toda cultura Ocidental.

Apenas no século IX que a escrita foi redescoberta pelos gregos. Entretanto, esta agora não seria privilégio de poucos, mas um bem comum. Grande parte da população se instruiu, e com o advento desse fato, iniciou a Era de Ouro grega.

Os cidadãos passaram a ter cracia, ou seja, poder, portanto surge um novo conceito: a democracia. Alguns passaram a questionar o contexto político e cósmico, portanto: nasce a filosofia. A ciência, a economia, a arquitetura, a religião, a sociedade, tudo estava transformado após a invasão dos Dórios. O que muitos consideraram um momento escatológico se mostrou um gênesis de uma nova visão, uma nova postura. Os homens agora passaram a pensar por si próprios, passaram a serem livres. Do cabresto da ignorância, passaram para a luz da sabedoria.

Da guerra, se criou a deusa Filosofia.

Do término

UFF, 20 de maio de 2010



Realmente o livro é apaixonante! O Retrato de Dorian Gray inovou a literatura inglesa, criticou os costumes da alta sociedade de Londres, imortalizou Oscar Wilde. Em quase 300 páginas foram impressos em letras garrafais a paixão intensa do autor.

Nessas páginas Dorian surgiu como um menino inocente, imaculado, narcisicamente belo; nelas o pintor, Basil Hallaward, se apaixonou por Dorian e toda sua arte ganhou vida e encanto; nelas também, Lorde Henry Wotton teve um novo discípulo para ensinar seu hedonismo.

O acaso trouxe a amizade aos três. E no momento em que ela passou a existir algo misterioso enviou juntamente uma maldição. Dorian se perderia para sempre. Sua alma sai de seu corpo e povoa o retrato; os papéis se invertem. Dorian se banha na beleza, mas ela o faz refém. Por ela é corrompido e dela não consegue escapar. Sua deusa foi sua ruína!

A vida de Dorian foi fantástica, mas sua morte, memorável. Dorian Gray morreu no séc XIX, porém, seu espectro continua encarnado: seu nome: O Retrato de Dorian Gray

Da reviravolta grega

Niterói, 13 de maio de 2010

 (Péricles na Ágora grega)

"A Grécia se reconhece numa certa forma de vida social, num tipo de reflexão que definem a seus próprios olhos sua originalidade, sua superioridade sobre o mundo bárbaro: no lugar do Rei cuja onipotência se exerce sem controle, sem limite, no recesso de seu palácio, a vida política grega pretende ser o objeto de um debate público, em plena luz do sol, na Ágora (centro da cidade - local de debate), da parte de cidadãos definidos como iguais e de quem o Estado é a questão comum; no lugar das antigas cosmogonias associadas a rituais reais e a mitos de soberania, um pensamento novo procura estabelecer a ordem do mundo em relações de simetria, equilíbrio, de igualdade entre diversos elementos que compõem o cosmos." (Jean-Pierre Vernant, As origens do pensamento grego, ed. Bertrand Brasil, p. 12)

Os gregos são filhos da Cidade; a "filosofia é filha da cidade". Depois que abandonam o passado Micênico, por conta da invasão dos Dórios, os gregos estruturam uma nova forma de sociedade, com ela uma nova forma de pensar, e com esta última, a razão, uma nova forma de enxergar o mundo. Seus mitos, aqueles de "soberania", dão lugar ao equilíbrio presente em cada homem; a sociedade estruturada na mitologia dá espaço à um pensamento laico. É uma reviravolta e tanto...

Pergunto-me: será que precisaremos da invasão de um povo estranho que nos leve a repensar nossas crenças, nossos dogmas, para que enxerguemos que essa divinização das figuras de poder (políticos, papa, pastores, sábios, sadus, confenrencistas) não passa de um profundo engano?! De uma obstrução da Razão?! Será mesmo preciso uma nova reviravolta grega?!

Da ausência

Rio de Janeiro, 08 de maio de 2010


Overdose, não mata. Por mais que eu queira que essa saudade morra! Sim, te vejo todos os dias, quase durante todo ele. Seu andar eu não me esqueço, suas gírias eu sei de cor, seus hábitos eu prevejo. Tenho uma overdose de você todos os dias, mas se me afasto durante um dia, um ínfimo e único dia sequer, a abstinência me arrebata, essa que a overdose não matou.

Bem que queria morrer de tanto te ver, mas essa overdose, em mim, não faz efeito. Ela só aumenta minha necessidade de você! E quando você na está do meu lado, sinto-me desfalecer. Uma morte longa, lenta, silenciosa, terrível. Vou morrendo de saudade, sentindo a pior das dores, a dor da ausência.

Sim, nós brigamos. Com freqüência nos desentendemos, ficamos nervosos, em silêncio. Mas não é esse silêncio que me mata, e sim o silêncio de sua voz, quando não está do meu lado! Eu consigo perdoar. Perdôo todas as discussões, perdôo as palavras ásperas, perdôo o choro, mas não consigo perdoar a saudade que tenho de ti, saudade esta que espreme o coração.

Por que a overdose que tenho de você não me deixa em coma, para que eu só acorde quando você voltar a estar do meu lado? Por que ela não me faz enjoar de você, assim, quando não estivesse do meu lado, a dor não seria tão doída?! Por que essa overdose não barra as lágrimas antes delas saírem de meus olhos?

A única coisa que desejaria agora, quando estou longe de você, é que todos os milhares de segundos vividos contigo afogassem essa tristeza que me encarcera. Mas não, eles só me massacram ainda mais, desejosos de sua presença.

És químico. Porventura não podias inventar uma droga que amenizasse minha dor? Ou quem sabe uma droga que me faça desmaiar e só acordar quando me beijasse novamente? Se és químico, por favor, equilibre meu coração, pois neste, está faltando uma parte essencial. Falta-lhe o núcleo do átomo que é meu coração...

Por mais que te veja, sinta teu cheiro, ouça sua doce voz, toque teu corpo, saboreie teu gosto, de ti não me enjôo. Essa overdose não me mata! Tornei-me resistente a ela, e por isso sofro tanto sua ausência. Sofro porque uma parte de mim não está mais comigo, está em suas mãos. E suas mãos não estão perto de mim. Nelas não consigo encostar nelas. Sofro porque essa overdose me deixa vivo, e quando estou vivo, só quero uma coisa: estar do teu lado!!!

Do pensamento de Henry Wotton

Niterói, 04 de maio de 2010

Influenciar uma pessoa é dar a ela a própria alma. Ela passa a não pensar com seus pensamentos naturais. As virtudes que possui deixam de ser, para ela, reais. Os pecados que comete, se é que existem pecados, são todos tomados por empréstimo. Ela se torna um eco de música de outrem, ator de papel não escrito para ela. (...) Hoje em dia, as pessoas têm medo de si próprias. Esqueceram-se da mais elevada das obrigações, a obrigação que devemos a nós mesmos. Mas, é claro, são caridosas. Alimentam os famintos, vestem os mendigos. A alma delas, entretanto, sente fome, está nua. (...) O terror da sociedade, base de toda moralidade, o terror de Deus, segredo da religião... são essas duas coisas que nos governam. (...) Creio que, se o homem vivesse uma vida plena, completa, se desse forma a toda sensação, expressão a todo pensamento, realidade a todo sonho, creio que o mundo conquistaria um impulso tão novo de alegria que nos esqueceríamos de todos os males do medievalismo e retornaríamos ao ideal helênico, a algo mais requintado, mais substancial mesmo, quem sabe. (...) [mas] a autonegação que desfigura nossa vida. Somos castigados por nossas recusas. (...) Resista, e a alma adoecerá, na saudade das coisas que proibiu a si mesma, no desejo por aquilo que suas leis monstruosas tornaram monstruoso, ilegal. Tem-se dito que os grandes eventos do mundo ocorrem no cérebro. É no cérebro, apenas no cérebro, que ocorrem, também, os grandes pecados do mundo.”(O retrato de Dorian Gray)

Um trecho complexo este. Possui em si, no mínino, três pontos a serem discutidos, e que podem gerar muitas visões interessantes. As palavras escritas acima, novamente, saem da boca de Lorde Henry Wotton. Um grande homem, a propósito. Um típico inglês, mas só nas aparências, já que sua mente era menos ortodoxo do que seus contemporâneos. As frases saem dele, mas os pensamentos saem do autor, Oscar Wilde. Cabe a cada um por si só ler as palavras de Wilde, e pôr-se a pensar.

De Dorian Gray

Niterói, 04 de abril de 2010


– A história é muito simples – disse o pintor, algum tempo depois. 
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-- Há dois meses, compareci a uma recepção na residência da lady Brandon. Você sabe que nós, pobres artistas, temos que, de tempos em tempos, nos exibir em sociedade apenas para lembrar ao público que não somos selvagens. De fraque e gravata branca – foi você quem mo disse, um dia – qualquer pessoa, até mesmo um corretor de valores, consegue a fama de civilizado. Bem, eu estava na sala, já fazia uns dez minutos, conversando com umas matronas imensas, de trajar exagerado, e com uns acadêmicos entediantes, quando, de repente, tive consciência de quem alguém me olhava. Dei meia-volta e, pela primeira vez, vi Dorian Gray. Quando nossos olhos se encontraram, senti-me empalidecer. Fui tomado por uma sensação curiosa, de terror. Sabia que deparara, frente a frente, com alguém cuja personalidade, por si só, tão fascinante, me absorveria, caso eu o permitisse, toda a natureza, toda a alma, minha própria arte, e eu não desejava influências externas em minha vida. Você mesmo sabe, Harry, quanto eu, por natureza, sou independente. Sempre fui meu próprio dono; sempre o fui, pelo menos até encontrar Dorian Gray (...) Algo parecia dizer-me que eu me encontrava à beira de uma crise terrível em minhas vida. Tomava-me a sensação estranha de que o Destino guardara, para mim, alegrias requintadas, tristezas requintadas. (...) Nossos olhos mais uma vez se encontraram. Imprudência minha, pedi a lady Brandon para apresentar-me a ele. Talvez não tenha sido tanta imprudência, afinal. Foi apenas inevitável, pois teríamos conversado um com o outro, mesmo sem apresentação. Tenho certeza que sim. Depois, Dorian disse a mesma coisa, pois ele, também, senti que estávamos destinados um para o outro.” (O retrato de Dorian Gray)
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O belíssimo Dorian Gray. Com descrições dessas somadas às de Lorde Henry Wotton: “Era mesmo muito bonito, os lábios escarlates bem torneados. Havia algo, naquele rosto, que fazia com se acreditasse nele imediatamente. Ali estava toda candura e também a pureza passional da juventude. Sentia-se que o jovem se mantivera inatingido pelo mundo.”, difícil não se apaixonar por esse estranho personagem. Figura enigmática, bela, e narcísica!
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Quando Basil Hallward se depara com tal rapaz, ele é arrebatado. Viria mais tarde a declarar: “senti que estávamos destinados um para o outro”! Isso... é a experiência do belo, misturado à paixão, juntamente com o mistério, que produz o amor. É minha experiência com meu amor, meu próprio rapaz belo, apaixonado, enigmático. Meu próprio Dorian Gray. E assim como Basil foi abduzido até os céus de Eros, eu também lá parei quando vi pela primeira vez meu amado.

Do ocultamento

Niterói, 04 de abril de 2010


"Passei a gostar da privacidade, com o tempo. Parece a única coisa capaz de transformar a vida moderna em algo misterioso, maravilhoso, para nós. A coisa mais comum, se a escondemos, torna-se deliciosa. Hoje em dia, quando saio da cidade, não digo à minha gente aonde vou. Se o dissesse, perderia todo meu prazer. É um hábito bobo, eu diria, que, de alguma forma, parece acrescentar, à vida das pessoas, uma boa dose de romance." (O retrato de Dorian Gray)

Ah, o escondido... Sempre mais gostoso! Alguém haverá de discordar? Aquela adrenalina, aquele suor gelado, aquelas mãos molhadas, aquelas pupilas dilatas, aquele coração em taquicardia, aquela olhada para trás: "vem gente?". Como não dizer que tudo isso deixa as coisas mais... gostosas?! É o espírito de adrenalina. O esporte radical. É o escondido!

O prepotente talvez leria minhas palavras com conotações sexuais, o que não é o objetivo - apesar de exalarem um pouco de carnalidade sim -, mas refiro-me à SURPRESA. O elemento surpresa deixa todos boquiabertos, estupefato, com olhos esbugalhados. Porém, justamente ele que produz um renovo na monotonia da existência. Pensaria diferente alguém que ganha um presente sem estar comemorando   aniversário? Ou a pessoa amada que é convidada para um belo jantar no meio da semana? Ou o casal que prepõe novas "brincadeirinhas" entre quatro paredes?

Viva a surpresa... Viva o romance!

Do parar no tempo

Niterói, 03 de abril de 2010



"Mas, na Igreja, acontece, ninguém pensa. Aos oitenta anos, o bispo diz a mesma coisa que o mandaram dizer quando ainda era garoto de dezoito anos; e, como consequência natural, permanece inteiramente encantador." (O retrato de Dorian Gray)

Continua Wotton com sua teoria da beleza vs inteligência! Dessa vez ele analisa o clérigo. Estes, são sempre belos, afinal, não pensam.

Saindo um pouco da esfera da Estética, da preocupação e conceituação do belo, dirijo-me ao fato que Oscar Wilde já percebera em sua época. "o bispo diz a mesma coisa que o mandaram dizer quando ainda era garoto de dezoito anos". Essa é uma característica da sistemática da religião. O que foi aceito em determinada época da tradição, assim permanece ao longo de anos, centenas deles, até milhares! A historicidade de determinada "história" religiosa não é posta à prova mesmo que o avanço da arqueologia; os dogmas não são revistos mesmo com as inovações da ciência; a mentalidade não é reestruturada mesmo com o apogeu da era da informação, do conhecimento, do saber.

Parece existir uma espécie de estagnação mental! O que um religioso aprendeu com dezoito anos, permanece o mesmo quando este possuir oitenta. Marasmo. Recalque. Uma existência toda abandonada às traças. Algo que estranho e que lamento. Um ponto negativo da religião, de todas em comum, é este engessamento ideológico-cultural-racional. Algo que só faz com que elas sejam ainda mais fanáticas, irracionais, soberbas, pretensiosas.

Se o bispo aprende algo que mandaram ele aprender com dezoito, e continua propagando isso com oitenta, só posso lamentar-me por aqueles que comungam desta fé pregada por este clero. O que visivelmente não é lamentado pelos fiéis.

Da beleza e da inteligência

Niterói, 03 de abril de 2010
O retrato de Dorian Gray ( E. d'Ete)

"Não vejo qualquer semelhança entre você, com esse rosto rugoso, forte, esses cabelos pretos, carbonizados, e o jovem Adonis, feito, ao que parece, de marfim e pétalas de rosa. Porque, meu caro Basil, ele é um Narciso, e você... Bem, claro, você tem uma expressão intelectual, e coisa e tal. Mas a beleza, a beleza verdadeira, termina onde se inicia a expressão intelectual. O intelecto é, por si só, um modo de exagero; destrói a harmonia de qualquer rosto." (O retrato de Dorian Gray, Oscar Wilde)

Henry Wotton está diante do lindo retrato de Dorian Gray. Estupefado com tanta beleza, dirige-se ao amigo e autor da obra Basil Hallward, dizendo-lhe que não via semelhança entre a obra e este, que anteriormente afirmara: "coloquei nele (quadro) muito de mim mesmo". Ora, para ele, Wotton, a beleza não pode se atrelar com a inteligência. Ela estraga a beleza. Por isso, para ele, Gray "é uma dessas criaturas sem cérebro, lindas, que sempre deveriam estar por perto no inverno, quando não temos flores para olhar, ou no verão, quando sempre queremos algo para nos refrescar a inteligência".

Haverá quem discorde dos pensamentos de Henry Wotton, contudo, pensando estatísticamente, é difícil encontrar alguém feio num Pânico na TV, ou numa novela da Globo, ou quem sabe, num cd religioso. Há quem discorde, eu...

Do retorno

Cachoeiro, 02 de abril de 2010


Volto para lugar que durante anos me assentei para escrever, pensar, chorar. Pouco mais de um ano se passou para que eu aqui retornasse. Pouco mais de um ano, e tão vastas mudanças!

O tempo, que em si mesmo não existe, mas que assim mesmo contamos, não transcorreu muito, até relativamente pouco; alguns espaços de dias, semanas, meses. Nesse tempo deixei de ser criança e me transformei em homem. A infantilidade das conversas, a imaturidade das perguntas, a inocência do choro, a pirraça do desejo não atendido, tudo, foi trancado no baú da infância. O que está aberto, dolorosamente escancarado, é o baú da maioridade.

No caminho da maioridade, os açoites não cessam de flagelar minhas costas, e o sangue é sempre fresco. Os pés, sempre cansados, por vezes vacilam, ou até mesmo param; porém, basta um único segundo no ócio e a chibata ressoa novamente em minhas costas. As lágrimas costumam molhar o seco chão por onde passo, e diferente de antes, elas sabem o motivo de sair de meus olhos. Neste caminho, a solidão é minha única companheira.

No curto espaço de dias, semanas, meses, tudo, absolutamente tudo, mudou. Fui arrebatado. O mundo mudou. As verdades fugiram. O oráculo silenciou. Adentrei um caminho, me aprofundei nele, fui engolido por ele, e nele, minhas abstrações cresceram. E minha mente já não podia descansar no pensamento de voltar atrás. Não, já tinha ido longe demais!

Neste caminho, no meio da escuridão, eu gritei. Sim, gritei ao Deus do oráculo que antes me respondia. Silêncio. Ele nada respondeu. Gritei ainda mais, desafiei-o. Silêncio. Como se não fosse suficiente, injuriei teu nome na esperança de que se enraivecesse e então quebrasse o silêncio. Engano. Tudo era... silêncio. O ensurdecedor silêncio congelava meu rosto com a dúvida de Sua existência. Bem que quis, mas não podia parar no silêncio. Meus pés voltaram a ressoar.

Neste tempo, as pessoas se afastaram de mim, ou melhor, eu, delas. Bem que podia conviver com suas visões bipolares, e pretensiosas. Mas não, tive que me afastar. Covarde ou corajoso? Vilão ou herói? Tento ainda responder, mas é difícil encontrar uma resposta. Só não pude me permitir algo: o furto de minha dignidade. Por isso, nesse tempo todos os que presunçosos julgavam já não mais me atraíam. E de suas companhias me abstive. Se elas são simples demais ou eu complexo demais, também não consigo responder!

Nesse pouco mais de um ano, a imagem de meu espelho mudou. Já não é mais aquele “serzinho” de alguns poucos anos de idade que vejo, mas alguém que as costas começam a encurvar, e as pernas a tremer. Eu pergunto para o tão límpido espelho: “onde estão as respostas?”, ele, nada responde. Arremesso ele contra a parede. Estilhaça. Pra nada presta!

Foram cruéis comigo, neste tempo! Não me pouparam a crítica, não me deixaram com a venda. Sacudiram-me; arrancaram minhas pálpebras, e por mais que tente, é impossível fechar os olhos. Empurraram-me num abismo, o mais profundo de todos. E nem se quer deixaram uma corda para que eu tentasse voltar à superfície. Enquanto chorava na escuridão, gritaram: “pare de pirraça, tu não és mais criança”. Engoli o choro! Levantei-me e continuei a caminhar, tal como cego, um cego sem pálpebras.

Neste tempo, pouco mais de um ano, errante pelo caminho, descobri de quem era as pegadas que vinham atrás de mim. As pegadas daquele que me atormenta, daquele que não me deixa voltar atrás, que não me deixa parar, que me empurra no abismo. Descobri que as pegadas eram de meu carrasco, do meu malfeitor. Descobri que as pegadas eram do Conhecimento, sim, dele, meu carrasco Conhecimento!

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